2008-10-08

Segurança alimentar: da norma ao facto


Todos nós sabemos que nos estabelecimentos de produtos alimentares, ao longo de toda a cadeia desde o produtor ao consumidor, para se garantir a qualidade e a inocuidade dos produtos e finalmente se proteger a saúde das pessoas, se deve cumprir um conjunto de regras, normas e procedimentos, que são abrangidos pela aplicação do HACCP, Sistema de Análise de Riscos e Controlo de Pontos Críticos, no âmbito da Segurança Alimentar. Aliás, eventualmente para que nós não nos esqueçamos, em alguns Estabelecimentos de Restauração e Bebidas até está afixado na porta (ou junto da porta), em local facilmente visível, um painel com a indicação de “Neste estabelecimento cumpre-se o HACCP”.

No entanto, eu não sei qual é o tipo de informação e de formação que é facultada aos empresários e aos trabalhadores desses estabelecimentos. Sei que é vendido muito papel, para consulta – arquivado em dossiers volumosos – e para afixar no equipamento de frio e/ou nas paredes, da sala, da cozinha e até das Instalações Sanitárias. E sei, também, por experiência pessoal – decorrente do exercício da profissão de TSA –, que muitos daqueles profissionais pouco sabem sobre Higiene Pessoal. Logo, concluo, pouco saberão sobre Segurança Alimentar.

Dois exemplos – fora do concelho onde trabalho, e, portanto, em concelhos onde só poderia intervir como consumidor, recorrendo ao “Livro de Reclamações”. O que não fiz, esclareço.

Em Santarém

Hoje, terça-feira (08/10/07), quando saí do Laboratório de Saúde Pública chovia torrencialmente. Tinha previsto um almoço de trabalho (para evitar uma reunião formal) com duas colegas que, por motivos pessoais, não puderam comparecer. No restaurante que tinha proposto para nos encontrarmos, almocei na sala para fumadores. Já depois das 14.30 horas, enquanto tomava café, reparei que a cozinheira, jovem, se sentara à mesa da (aparentemente) proprietária. Para conversar e fumar um cigarro. Um direito que lhe assiste. Mas, parece-me, podia ter evitado vir para a sala (devidamente vestida para trabalhar na cozinha) de luvas… descartáveis, que manteve enquanto conversava e fumava destressantemente…

No Cartaxo

Na semana que passou. Como habitualmente, as vistorias em conjunto com outras entidades acabaram tarde. Quando cheguei ao restaurante onde habitualmente almoço seriam talvez 14.00 horas. O almoço foi razoável. Trata-se de um estabelecimento que numa visita anterior me surpreendera positivamente. Então, cerca das 15.00 horas, ao proceder ao pagamento da despesa através do terminal de Multibanco - no balcão, logo após a entrada - reparei que a cozinha estava limpa. Toda a loiça usada para a confecção das refeições e o empratamento fora lavada e estaria arrumada. A cozinha estava pronta para mais uma sessão de trabalho. Transmiti esta informação a muita gente, como exemplo a seguir na gestão de um restaurante que se propõe observar com rigor a implementação do HACCP.

Todavia, na semana que passou, pela mesma hora mas desta vez no Parque de Estacionamento. Sentado no carro, fumo um cigarro (provavelmente também para destressar) e oiço a Antena 2. Pouco tempo depois reparo numa senhora vestida de branco, de bata e avental, com um gorro a cobrir-lhe a cabeça, que se aproxima. Com um cão, grande, pachorrento, decerto com muitos anos, de cor castanha, com malhas brancas. A cena seria decerto comovente para muita gente, sobretudo para as crianças. Para mim, confesso-o, a cena ser-me-ia indiferente se a senhora não fosse a (uma das) cozinheira (s) do restaurante. E não despira sequer a luva da mão direita - a única que muitos cozinheiros vestem, talvez por razões económicas - com que afagava o cão...

Á guisa de conclusão: há quem venda (muito) papel, há quem verifique se os estabelecimentos cumprem o HACCP, mas aparentemente não há quem consciencialize e responsabilize os profissionais da área da restauração sobre o que é de facto a segurança alimentar.

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Ilustração: Imagem recolhida em Colégio de São Gonçalo.

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